terça-feira, maio 23, 2006

VALE A PENA SER ADULTO?


Dóris Fleury

No último fim-de-semana, a Revista da Folha publicou uma matéria que deve ter deixado muito marmanjo coçando a cabeça. Era sobre aqueles adultos que, já entrando na faixa dos quarenta, têm comportamentos e atitudes associados à juventude. Pior: fazem isso na boa, sem a menor dor na consciência.
Pior ainda: se eu for honesta, me incluo nessa faixa.
Tá, eu tento ser madura. Responsável. Pago minhas contas. Cuido da minha prole. Vou ao médico com regularidade e tento não pisar na jaca. Drogas, só as legais – bebida alcoólica, Lexotan, televisão, essas coisas. Em situações complicadas, procuro manter a calma e não ter chilique. E na hora de educar filho - já descobri há anos - não dá pra bancar o adolescente e ser amiguinha da figura. Você é mãe, é figura de autoridade, então tem que se comportar como tal. Venho de uma geração que aprendeu a detestar a autoridade por conta de umas experiências desagradáveis que a gente teve – nada grave, só uma ditadurazinha... Mas na hora de educar, se você se recusa a “contrariar” a molecada, e foge das decisões desagradáveis, vai ter problemas.
Aprendi a aceitar decepções profissionais, até porque essa história de escrever não é moleza, e você pode se esforçar pra caramba e morrer na obscuridade. Aliás: já descobri que vou morrer. E que, sendo a vida curta, não vale a pena perder tempo com bobagem. Tenho muitos amigos. De vez em quando um pisa na bola. Guardar raiva por quê? Melhor esquecer a figura que aprontou com você, e valorizar aqueles que são ponta firme. Achar que a humanidade é composta apenas de safados irrecuperáveis é tão infantil quanto achar que no mundo só existem pessoas boas e angelicais.
Claro que cuido da aparência, até porque sou vaidosa. Mas não tenho a menor ilusão de que vou continuar aos 40 anos com aquela pele lisinha dos vinte. Aplicar botox e ficar com cara de boneca de borracha? Nem pensar! Esticar a cara inteira para apagar as marcas de tristeza ou de alegria que a vida me deu? Tô de boa.
Então, juntando tudo isso, será que sou adulta?
Gente, eu tenho uma página no Orkut.
Precisa dizer mais?
Então vamos lá. Pertenço à primeira geração que gosta de rock... como seus filhos. Eu e minha filha passamos horas discutindo méritos e deméritos das nossas bandas favoritas. Isso é bom, mas me deixa um pouco confusa. Meu pai só faltava vomitar com as músicas que eu ouvia. Estarei fazendo algo de errado?
Brinco horas com meus sobrinhos, fico lá mexendo nos games deles e de vez em quando ainda ouço um “nossa, tia, mas você é muito ruim!”. Não me abalo: logo depois já estou disputando sorvete e bolo com a molecada no tapa.
'Magina se os pais da gente se dignavam a brincar conosco!
Adoro cinema e quando vejo estou consumindo coisas que já devia ter deixado de lado faz anos, ridículas, infantis, pueris etc. Homem Aranha. X Men. Batman. Gente, isso é quadrinho... bobagem... coisa de criança! Os enredos têm a profundidade psicológica de um pires! E o Friends, então? Eu adorava o Friends, um seriado cuja piada básica é um bando de trintões se comportando como crianças.
E outra: não posso ver um desses caderninhos da Hello Kitty.
Eu faço piada com tudo. Isso com certeza não é comportamento adulto, sério! Os adultos, na minha época, nunca riam. Estavam sempre preocupados com coisas graves de adultos, às quais nós, crianças, não tínhamos acesso. (hoje, no jardim da infância, os coitados já sabem o que é o PCC...).
Pois aí é que está o problema: na minha época, noventa e nove por cento dos adultos era muito chato. É claro que a gente queria virar adulto pra fazer um monte de coisas legais... mas não queria ficar chato. Será que foi esse o nosso problema?
Devo dizer que a passagem para a idade adulta me decepcionou muito. Promessas maravilhosas da maturidade nunca se realizaram. Por exemplo: meu sonho era crescer para usar perucas que nem as da minha mãe. Usaria uma ruiva de manhã, castanha à tarde e loira à noite. O tempo passou, eu cresci e as perucas, infelizmente, saíram da moda.
Queria ficar adulta pra ver TV até a hora em que quisesse. Mas descobri que na TV só passa porcaria.
Queria ficar adulta para ganhar um monte de dinheiro e ser rica. Sem comentários.
Queria ficar adulta para dirigir um carro. Hoje dirijo, e é um pesadelo: trânsito horrível, gasolina cara, despesas de manutenção, e isso sem falar na culpa por contribuir para o aquecimento global.
É, a gente cresce e descobre que a vida de adulto não é fácil, as recompensas são poucas, as obrigações pesadas etc. E ainda por cima começam a te chamar de “tia”.
Aí o que você faz?
Abre uma página no Orkut.
A propósito: alguém aí quer ser meu friend? Tô precisando chegar nos cem...