terça-feira, novembro 21, 2006

MUNDO ANIMAL

Dóris Fleury

Hoje foi dia de levar meus animais para serem lavados, penteados e enfeitados na pet shop.
Trata-se de uma operação relativamente simples, que passo a explicar para vocês:
Primeiro, eu subrepticiamente escondo a guia dos meus dois cachorros dentro da bolsa. Isso tem que ser feito às escondidas, pois minha casa é toda envidraçada e lá do quintal os dóguis podem ver que a guia entrou em ação. Caso isso aconteça eles surtam, entram em estado de agitação maníaca, latem feito uns desesperados, pulam em você, e caso você seja um dono do sexo masculino (o que felizmente não é o meu caso) são capazes de atingir certa área muito importante e delicada do seu corpo, e deixá-lo rolando de dor no chão durante vários minutos. Já aconteceu, acreditem.
Depois de esconder a guia dos cachorros, eu me aproximo com ar inocente da gata, que está muito tranqüila cochilando em cima da tábua de passar roupa. Isso acontece porque hoje de manhã ela já derrubou um vaso de flores, um cesto de lixo e o MP3 da dona. Sempre que as coisas estão chatas e monótonas, ela começa a derrubar tudo que vê pela frente. É assim que combate o tédio.
Continuando, me aproximo com ar inocente da gata e a enfio dentro da gaiola para transporte, onde ela passa a miar como se alguém a estivesse estripando.
Saio pro quintal e os cachorros me seguem com a sua agitação habitual, ou seja, apenas latindo de língua de fora e fazendo um ar muito ocupado e importante. Chego na garagem, abro a porta do carro e grito de repente: PASSEIO DE CARRO!!! Eles então se precipitam feito dois foguetes desgovernados para dentro do veículo, e lá dentro começam a pular nos bancos, latir um para o outro, e espalhar pêlos pra tudo quanto é lado. De forma que sempre que dou carona pra alguém, esse alguém, depois de entrar no carro e limpar vários pelinhos da sua roupa, invariavelmente pergunta: “Você tem cachorro, né?”
Pronto! A parte mais difícil já acabou. Agora é só subir de volta para a casa, pegar a gaiola e trancar a casa. A gata enquanto isso continua miando toda aflita. Como o carro já tem toda quantidade de entropia que um ser humano é capaz de suportar, coloco a gaiola dela no porta-malas.
Com todos os caninos e felinos trancafiados, abro a porta da garagem, tiro o carro, dou a partida e me dirijo à pet shop. Enquanto isso o Zé e a Rita (cachorros) latem tão alto e com tanto entusiasmo que mal consigo ouvir meus pensamentos. E a Lucy (gata) para não ficar atrás, mesmo de dentro do porta-malas ainda consegue empestear o carro com seus puns.
Isso sempre acontece quando ela fica nervosa.
Nunca entendi porque meus cachorros latem tanto na rua. Para os ônibus? Para as motos? Essas duas coisas parecem agitá-los bastante; mas mesmo que não haja ônibus nem motos, eles continuam latindo com toda a força dos seus pulmões. O Zé eu ainda consigo subornar abrindo a janela do carro. Ele então cala a boca e fica lá, feliz da vida: um cachorro branco com uma tremenda cara de vira-lata e ar abobalhado, babando com a boca aberta e contemplando a paisagem. Não é de admirar que as pessoas dêem risada. Sou um espetáculo público.
Mas pelo menos ele ficou quieto. Já a Rita continua latindo feito uma louca.
Oba, finalmente me aproximo da pet shop. E tem uma vaga para estacionar, a apenas dois quarteirões! Que sorte!
Assim que eu abro a porta os dois cães se precipitam para fora, e é um verdadeiro milagre que eu consiga agarrar as guias a tempo de salvá-los do atropelamento. Aí, tenho de pegar a Lucy no porta-malas – ela está furiosa, miando naquele tom que os gatos usam quando realmente esgotaram toda sua paciência.
Acabou? Não! Segurando as guias dos cães numa mão e a gaiola na outra, eu ainda tenho que pegar minha bolsa, pois não se deixa bolsa dando sopa dentro do carro numa cidade como São Paulo.
A caminhada de dois quarteirões até a pet shop eu deixo por conta da imaginação de vocês. Basta dizer que, quando chego lá, estou enrolada nas duas guias e cada cachorro quer ir numa direção diferente.
Na porta da pet shop tem um banquinho. Sentada nesse banquinho, sempre fica uma tchurma de cidadãos da terceira idade da Vila Madalena, devidamente adornados de bonezinho e camisa xadrez. Depois de uma honesta vida de trabalho, esses senhores se aposentaram e agora têm todo tempo livre para tirar o sarro dos pobres donos de animais que chegam àquele estabelecimento, esbaforidos, suando e tentando controlar seu rebanho canino.
Que beleza. Espero que em breve chegue a minha vez de me dedicar a tão divertido passatempo.
Toco a campainha e ninguém aparece, então não faço por menos: vou entrando (o portão está aberto) e depositando meus adoráveis animais: os cachorros presos pela guia em ganchos de parede, e a caixa da gata num cantinho qualquer. Já avisei por telefone que estavam chegando. Agora, os responsáveis que se virem! Saio da pet shop correndo, e volto pro meu carro.
Pronto! Tão vendo como é simples cuidar de animais?
Na próxima crônica, conto como trouxe os bichinhos de volta ao lar.