quinta-feira, abril 06, 2006

CONSELHOS PARA AS CABAÇAS.


( imagem encontrada no Google, através da procura pela palavra "Virgindade". Autoria desconhecida)

( texto publicado originalmente em Turma da Groselha.)











Para minha avó Nícia ( in memorian )




As pessoas estão casa vez mais virgens do ponto de vista intelectual. E eu não entendo o motivo. Acabo de voltar de um passeio noturno. Por poucos reais, comprei uma revista com dossiê completo sobre o Marquês de Sade e outra com os 150 anos de Freud. Tudo mastigadinho. Linguagem fácil e acessível. Fiz o teste com uma mocinha de 19 anos. Ela se negou inicialmente, querendo sexo imediato. Eu disse que sexo, só depois de ler ambos dossiês. Sade e Freud. Ela leu. E ia se animando.
- Como eu ainda não conhecia ! Eu tinha ouvido falar, tem comunidade no Orkut, você faz parte, mas tem tanta coisa legal !
- Legal ?
- Não tira sarro.
- Não...é que eu também acho legal.
Eu conheço as ditas comunidades no Orkut. Elas também são legais. Alguém aparece e sugere um super tema. Eu respondo, alguém responde, e o tema morre. Eu vou atrás da pessoa, peço "add" ( adicionar), e recebo um "quem é você ?" ( isso é o cabaço conotativo ). Me dou ao trabalho de explicar, Freud, Sade, tema, tópico. Não recebo resposta, sou bloqueado ou levo um "puxa, tenho tanta comunidade que fica difícil seguir todas".
E tem gente que cai. E quando cai, você oferece um docinho, uma revista de banca de jornal, e a figura se molha em sodomas e 120 dias em 5 minutos de quero-quero. Depois de um mês, você telefona:
- E aí, leu mais algo de Sade, Freud ? Tem até mangá .
- Quem é você ?
- Paulo. Castro. O PC.
- Ah, oi, querido ! Super-saudades. Não, não tive tempo...
- Tá. E hoje, vai fazer o que ?
- Tomar banho e depois ir pra boate "Toque de NewJazz"
- Parece legal...
- É uma boate gay.
- Legal. Você é gay ?
- Nada. Sou de boa. Gosto de homem. Você que não quis eu, lembra ?
- É que você tava curtindo as revistas...fiquei olhando, tendo esperança.
- Ah tá. Me liga no cel.
- No céu.( só eu sei da piada íntima e sem graça, vingança semiótica )
Acabo de ler uma matéria do Umberto Eco.
Isso, aquele, do filme "O Nome da Rosa". Não, não o 007. O autor do livro, legal, legal.
O Eco diz que o foda da internet é que existe a tal Enciclopédia Nética, que todos podem postar sobre todos assuntos e um vai corrigindo a besteira(sic) que o outro escreveu. Isso coloca em contato dois tipos de figura, agora opinião minha, PC, isso, legal :
a) O intelectual
b) O mal-intencionado.
O intelectual tende a prezar pela justiça da informação.
O mal-intencionado, deturpa a informação, na zoeira mesmo.
Os dois são maravilhosos. Qualquer caminho levaria, um para Grécia e o segundo, pela via sofística, até Roma. Já estaria de maravilhoso tamanho.
Não rola até que alguém mostre a rola.
Legal.
E depois esquece.
A grande questão do cabaço intelectual é :

- Do que se trata o "legal" ?


Barthes( O Roland, do "Fragmentos de Um Discurso Amoroso", super legal) vai dizer, no "Prazer do Texto", que a função da escrita é seduzir.
Então, se ouço "legal", sinto que houve sedução.
Mas a sedução se esgota no tempo. É o que vemos, na prática. Não como a tal "paixão", que de certa forma deixa uma ou outra marca, foto, caligrafia, vela na mesa da cantina. Não. Falo de amnésia. E mais que isso de amnésia seguida de repulsa( histeria feminina) :
- Não lembro e não quero lembrar.
ou
- Não me confunda com o seu desejo !!!
Carajo.
Sade é pré Revolução Francesa.
Freud é 150 anos.
Clássicos.


Clássicos: a repulsa é clássica.
A prisão pelo enojado é clássica.
A resistência, o recalque, a amnésia histérica, a melancolia são clássicas.
O cabaço estaria explicado.
Mas não.
UOL : o maior provedor de internet da América Latina.
Acesso "Vídeos Caseiros Amadores" de putaria com a maior facilidade. E pergunto pra moça, um mês antes do telefonema da boate gay :
- Você curte os vídeos caseiros da UOL ? ( ela é assinante, como eu )
- Acho um tesão. Parece que você tá invadindo a privacidade. Ah, larga esse bombom e vem cá !
- Trufa.

E aí ?
Vídeo Caseiro com esporra na cara é aceito pelo inconsciente. " Crimes de Amor" ou " Mal-Estar na Civilização", não.
A sedução passa pela palavra. Não tem jeito. Mesmo que seja a palavra escrita na camiseta: "I love Barthes". Não o Simpson. Legal.
O cabaço é a resistência ao legal.
O legal é a palavra.
Ok ?
Então:
***A sedução é legal***
( caralho, uma puta do Orkut me pede sempre diante do "difícil" para que eu "desenhe": o desenho básico da letra articulada em juízo é o silogismo).
Então:
O cabaço é a resistência à sedução ( OK ! Faz e tem sentido histórico.)
&
O cabaço é a resistência à palavra (OPS !)
Como assim ?
Talvez o temor clássico que Eco ressalta tenha um sintoma no internetês:
"vc, akele, neh, naum, etc"
O internetês seria o sintoma dessa histeria.
Não. Naum.
É preconceito. As palavras se quebram ( vosmicê--->você--->vc), exatamente por serem tão vivas quanto o movimento do desejo. Aceitemos o internetês em seu ambiente, cada vez mais amplo. Mas ele não está vindo acompanhado pelo tesão. O tesão morreu.
O cabaço é a morte do tesão, é a estagnação da palavra...que, todavia, mais do que nunca, está em movimento no mundo virtual. Está mesmo em movimento só pelo internetês ? Pela vagina sintática arrebentada e arrebatada em BBB-pedofilias ?
Não.


CONCLUSÃO :

Acho que :

A velocidade do legal está tão grande
que não dá mais tempo da palavra legal ( "lgl", nem mesmo assim ),
se anexar( como um arquivo ao e-mail) a um conteúdo semântico.
Não dá tempo.
O legal é legal demais pra si mesmo.
A palavra não mais seduz. Nem a imagem. O vídeo caseiro é legal pois traz a marca da cozinha, do táxi, da urbanidade de fios e Virtuas, demais bandas largas.
Depois da camisinha, vem a ejaculação precoce literal pela tara de estar usando camisinha, i.e., protegido contra o legal do Outro. Do encontro. Depois da camisinha, vem o prazer, que vários intelectuais ( da classe acima, "a") confessam: trepar sem preservativo. Óbvio. A pureza clássica é um risco, sem proteção, à neurose. Flerta-se com a sedução, mas ela é inaceitável. Fode-se com a sedução, mas não se seduz. O tempo lógico foi confundido, entre querer e desejar, com o tempo da memória afetiva( dito anos atrás, bienais atrás, "inteligência emocional"), entorpecida de cabaço da preguiça diante do jornaleiro berrando.
De modo que, de toda forma, pela via da racionalização do banal, a estrutura histérica continua sendo a mesma matematizada por Freud e bem antes disso, legalizada por Sade.
Beijos;
( claro que o traço a comentar seria a vidência do : "Que legal, Paulo" )
Paulo Castro.
pcpsiq@uol.com.br






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