terça-feira, julho 25, 2006

PEQUENAS DESILUSÕES

Dóris Fleury

Não, não são apenas as grandes decepções que machucam. É triste ver, por exemplo, o Lula finalmente assumir o poder e fazer essa merda de governo. É muito triste também – como vem acontecendo com vários amigos – escolher uma faculdade por vocação, se matar de estudar, ganhar o diploma e, anos depois, verificar que não consegue ganhar a vida com aquela profissão. E as decepções amorosas então? O fim do casamento, os problemas com os filhos, a velhice dos pais... Tudo isso é muito triste, de fato. Mas também contam as pequenas decepções; aquelas que pouco a pouco, inapelavelmente, vão nos tirando a inocência infantil, e a crença em algum tipo de justiça nesse mundo. Por exemplo, você acha justo que...
.... Papai Noel não exista?
... seus pais tenham encomendado um novo bebê?
... as bonecas não cresçam cabelos de novo, depois que a gente cortou os originais?
... seu pai tenha ajudado você com a lição, e a professora te dado zero?
... seu jogador de futebol predileto se revele um chato que recusa autógrafos?
... sua professora mais legal abandone a classe para se casar?
... aquele creme anti-espinhas não funcione?
... o delicioso primeiro pilequinho seja seguido por uma ressaca fenomenal?
... os professores da faculdade, que você imaginava uns luminares, se revelem burocratas medíocres?
... o namorado que você adorava tenha te abandonado pela mulher mais chata da faculdade?
... aquele cara fabuloso com quem você passou uma noite, e que parecia tão entusiasmado, nunca mais te telefone?
... o estágio que você arrumou com tanto esforço seja uma bela porcaria onde você fica servindo café ou, no máximo, navegando no Orkut?
.... aquele chefe que você respeitava te passe uma cantada?
... a entrevista do emprego promissor desemboque num questionário sobre sua vida pessoal, incluindo a famosa pergunta: você pretende ter filhos?
... o seu primeiro carro, comprado com tanto esforço, tenha um problema na injeção eletrônica?
... a sua namorada reclame que você não consegue alcançar o ponto G?
... o carro dê oficina a cada seis meses?
... você desloque o ombro tentando achar o ponto G?
... o casamento que você queria fazer no meio do mato, ao lado de uma cachoeira, com todos seus amigos chapados, acabe em breguice total, com igreja e bufê, sua mãe vestida de cor-de-rosa, as damas-de-honra de azul-calcinha, e você de branco-tédio?
... os bebês façam xixi exatamente na hora em que você terminou de trocá-los?
... você descubra que o problema com o carro, na verdade, era um mecânico desonesto que te esfolou em vários milhares de reais?
... sua mulher não se importe mais com o ponto G, e, aliás, nem com sexo de forma geral?
... sua nova mulher, após alguns meses, também venha falar do ponto G?
.... seu filho não seja o mais inteligente da classe?
... aparelhos de dente sejam tão caros?
... bufês infantis custem uma fortuna, estimulem as crianças a berrar feito malucas, e pular na piscina de bolinhas até perder o aparelho de dente?
... e isso sem falar na coxinha fria que eles servem?
... seu marido tenha jurado, antes do casamento, que adorava dançar e era um ótimo mestre-cuca; e hoje passe longe da cozinha e das boates?
... seu filho que você educou com tanto carinho e opções culturais se torne pagodeiro?
... seu bar predileto seja invadido pela molecada, e você se pegue reclamando feito um velho rabujento?
... aquele filhote de poodle bonitinho que você comprou se transforme num maníaco sexual que ataca as visitas?
... o maiô do verão passado não caiba em você de jeito nenhum?
... o mau-humor da sua mãe tenha piorado com a idade?

Nenhum comentário: