sexta-feira, fevereiro 24, 2006

LITIGIOSOS

Dóris Fleury

Ontem eram um casal, hoje são só uma briga. Brigam pela casa. Pelo carro. Pelo fogão e pelo microondas. Pelos tapetes da sala. Pela cafeteira da Tia Arlete. Pela caneca Estive em Blumenau, lembrei-me de você...
Não têm filhos, felizmente. Mas brigam pela custódia do cachorro.
Os advogados das partes, exaustos, às vezes trocam comentários no corredor do fórum. Não agüento mais essa perua. O doutor me desculpe a franqueza, eu sei que ela é chata; mas seu cliente também é um maníaco. Terceiro corretor que ele manda avaliar a casa! O martirizado causídico encolhe os ombros, a colega quer que eu faça o quê?
Finalmente um juiz perde a paciência e encurta a conversa. Depois os senhores reclamam que a Justiça brasileira é lenta. Chega de bobagens. Façam logo esse acordo. A senhora leu? Está de acordo? O senhor também? Muito bem, assinem na linha pontilhada.
A casa é vendida, o dinheiro dividido, o carro fica com ela, ele se contenta com o fogão, o microondas e o freezer. Os tapetes, deram pra vizinha. A cafeteira... Onde foi parar a cafeteira?
Os dois se dizem roubados.
Meses depois, vão ao cartório assinar os papéis do divórcio. Agora é oficial. Sacramentado. Não há mais nada a fazer. Nem um tapete de banheiro pra brigar.
Aí eles vão embora, cada um pra sua casa. Chorar na cama que é lugar quente.

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