sexta-feira, outubro 06, 2006

5 de outubro de 2006

Saiu uma matéria no New York Times que eu tenho de comentar, porque é hilária!
A Vigilância Sanitária da cidade está querendo instituir novas leis para os restaurantes. Já se sabia que o fumo, ali, seria definitivamente proibido; e que as gorduras “trans” iriam pelo mesmo caminho. Mas existem mais idéias chegando por aí, e podem virar lei...
Pra começo de conversa: vamos combater a epidemia de obesidade. Os novaiorquinos estão ficando gordos! Por isso, os blintze (pãezinhos que vêm de graça, acompanhando o menu) serão reduzidos a dois por cliente. E fim de papo, não pode pedir mais.
Mas a obesidade não é o único problema que preocupa esses dedicados funcionários. Tem também a história do engasgamento. Nunca entendi porque, deve ser uma fixação oral; mas os americanos vivem preocupados com a possibilidade de engasgarem com a sua comida e morrerem sufocados. É uma obsessão nacional. Aí estão bolando uma idéia assim: os garçons, depois de servirem a comida, ficarão observando os clientes pra ver se eles cortam a comida em pedaços pequenos e mastigam direitinho. De relógio na mão, o garçom verificará se o cliente mastiga sua comida em no mínimo doze segundos. Inventaram até um nome bonitinho pra isso: é a PMI, Proper Mastication Initiative.
Outra: álcool faz mal pra saúde, todo mundo sabe. A idéia é limitar o consumo a duas doses por refeição. E chega!
Café, todo mundo sabe, dá insônia. Por isso, depois das dez da noite, os restaurantes novaiorquinos só serviriam o descafeinado.
E antes que vocês morram de rir e se sintam superiores aos americanos bobocas, lembrem-se: nós vivemos copiando as idéias deles. Cuidado, senão dia desses não poderemos mais comer uma chuleta sossegados, sem um garçom de plantão atrás da gente. Eu não duvido nada.

Pra mim, em Nova York, a diversão acabou quando chegou a hora das compras.
Não me entendam mal. Como todo mundo, adoro fazer compras. Adoro voltar pra casa com as sacolas cheias de coisas legais e diferentes, que não existem no Brasil - ou que até existem, mas aqui são muito mais baratas.
Não ligo pra roupa; adoro bugigangas eletrônicas, perfumes, CDs e livros, muitos livros!
Mas fazer compras em Nova York dessa vez foi uma tortura. Começou com um problema religioso: na segunda-feira era Yom Kippur, o principal feriado judaico. Tinha exatamente duas lojas abertas na Oitava Avenida, que é o melhor lugar pra comprar eletrônicos. Se eu soubesse disso, nem tinha ido pra lá naquele dia.
E sempre vem um brasileiro te contar que viu uma oferta fantástica numa loja que hoje, infelizmente, não está funcionando!
Eu poderia voltar no dia seguinte. Mas aí já seriam duas manhãs consecutivas vagando feito alma penada na avenida. Procurei eletrônicos em outros lugares, não achei nada que prestasse. No começo da tarde meus pés estavam me matando e aí pensei: compro tudo hoje mesmo nas lojas goy. Dane-se. Não vou ficar dois dias seguidos nessa situação.
Mas depois que tomei essa resolução, ainda sobrou um probleminha. Sou muito indecisa e demoro horas pra me decidir entre o modelo A e o modelo B. E coitada de mim, se surgir um modelo C!
Isso vale também para os perfumes, que são uma verdadeira tara pra mim. Deus criou os perfumes pra enlouquecer a Dóris. Aí eu entro na Sephofora, que é uma rede francesa de lojas de cosméticos que se instalou com tudo em NY. Entro e experimento todos, mas eu disse todos os perfumes femininos da loja. Se bobear, também uns masculinos.
Tenho até pena das pessoas que se aproximam de mim depois disso. Devo feder gloriosamente. E, é claro, não consigo me decidir por nenhum produto.
No último dia, a poucas horas de pegar o avião, resolvi ser dura comigo mesma. Olhei pro relógio e pensei: vou me dar exatamente meia hora pra escolher dois perfumes, e pronto. E cumpri o prazo!
O resultado é que estou até hoje olhando para dois perfumes e suspirando por um terceiro, que ficou lá na loja.
Livros: também saí da história me achando uma besta. Livro aqui é muito mais barato do que no Brasil, é impressionante. Mas me segurei pra não comprar tudo que via, porque depois teria que mandar pelo correio e tinha medo que ficasse muito caro (carregar no avião é excesso de bagagem na certa).
Aí na terça-feira de manhã descubro que, se você pode mandar um monte de livros pelo correio gastando uma merreca, tipo doze dólares. Me senti uma imbecil, mas já era tarde demais.
Ou seja... por mais cálculos que você faça, sempre sai frustrada. E é claro que, enquanto está pensando e calculando e negociando seus desejos, não passeia.
No meio do dia você está exausta, querendo sentar, descansar, comer, ir ao banheiro... e quem diz que tem lugar pra tudo isso? Pra comer tem as delis, com um monte de comida deliciosa; mas a maioria sem mesas para o cliente sentar, porque deli é mais supermercado do que restaurante. E os restaurantes propriamente ditos são caros. O Central Park está longe, você está cansada demais pra andar... e além disso, não gosto de almoçar com esquilos e sem-teto olhando minha comida.
Embora ainda prefira os esquilos às moças do Au Bon Pain.

Sair do hotel foi uma epopéia. Eu sempre faço malas grandes demais. Eu sempre uso no máximo a metade do que botei lá dentro. E, na volta, sempre tenho que comprar outra mala vagabunda, só pra acomodar o excesso.
- Ten dollar, lady, ten dollar! – apregoava o moleque na calçada de Chinatown, mostrando uma malinha barata dessas com rodinhas.
- Com o carrinho e tudo, ten dollar?
- Ten dollar, lady, ten dollar!
O moleque chinês não devia ter nem dezoito anos, e tudo que ele sabia falar em inglês era “ten dollar”. Eu tinha acabado de comer um cheesecake e estava de bem com a vida. Comprei. Quando cheguei em casa, percebi que o fecho da danada era precário. E daí que era ten dollar? Bela porcaria.
Na tarde de terça-feira, 3 de outubro, saí do hotel levando uma mala azul imensa, enorme, assombrosa, com a qual sempre viajo, e que no final da viagem estou sempre odiando. E mais a ten dollar xadrezinha onde só botei roupa, rezando pra que não me acontecesse nenhum acidente ridículo e as pessoas na rua ficassem sabendo exatamente que tipo de pijama gosto de usar.
As duas malas tinham rodinhas. Bela porcaria. Algumas coisas na vida são superestimadas, e aí está mais uma: as rodinhas.
Tive que fazer três baldeações de metrô até chegar ao aeroporto, arrastando minhas malas. Dava pra ver pela cara das pessoas que elas estavam morrendo de pena.

E aí no aeroporto você começa a pensar.
Bem que eu podia ter visto de novo a Frick Collection.
Ou o MOMA que eu não conheço.
Bem que eu podia ter assistido uma peça de teatro na Broadway.
Bem que eu podia ter ido ao Harlem ouvir um coro de igreja.
Ou passeado um pouco mais pelo Central Park.
Ou tomado um brunch de verdade na manhã de domingo.
Ou isso... ou aquilo...
Vai saber quando vou ter grana pra voltar.
E esqueci daquele passeio às margens do rio!
Mas aí é tarde demais, porque a aeromoça está pedindo pra apertar os cintos, os motores estão roncando, o avião taxiando pela pista. Ou seja: acabou-se o que era doce. Talvez as experiências boas da vida, sejam exatamente aquelas que te deixam querendo mais.
E mais. E mais.

Nova York é a grande cidade em todo seu esplendor, a Babilônia de luzes faiscantes, a Meca para onde vem gente de todos os lugares do mundo, querendo fazer sucesso ou simplesmente sobreviver.
O resto da América detesta Nova York. Chamam de “Liberalville”.
No mundo inteiro, fundamentalistas de todas as religiões odeiam a Grande Maçã. Como deu para ver recentemente.
Vão por mim: alguma coisa de bom essa cidade deve ter.

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